Num jardim de inverno nos fundos do prédio número 66 da Rua Nascimento Silva, em Ipanema (quase em frente ao célebre endereço cantado por Tom Jobim e Vinicius de Moraes), fica o estúdio do designer Carlos Alcantarino. Ali, as peças expostas revelam o tipo de trabalho a que ele tem se dedicado nos últimos tempos. Ao lado de vasos de estanho, série que ganhou prêmio internacional no fim dos anos 90, há castiçais de latas amassadas, ímãs de geladeira de tampinhas de refrigerante, poltrona de rejeitos de madeira e bandeja de placas de borracha reutilizada, entre outros produtos.
Pois é, Alcantarino é um cara ecologicamente correto, e seu nome virou referência quando o assunto é design sustentável. Além de produtos para lojas de Rio e São Paulo, como H.Stern Home, Duilio Sartori e Studio In, o paraense de 53 anos desenvolve projetos socioambientais Brasil afora, principalmente no Norte. Uma preocupação constante, ressalta ele, é tornar o design mais acessível a todos. O trabalho mais recente terminou no mês passado. Por três meses, ele frequentou cinco comunidades cariocas, coordenando o projeto Coleta Reciclagem, criado pela Coca-Cola. Com a ajuda de outros cinco designers, foram recrutadas artesãs nas favelas para bolar artigos usando apenas garrafas PET e de Tetra Pak.
Surgiram 28 produtos, entre cestos, porta-celulares e porta- guardanapos, agora vendidos no site da Rede Asta (www.asta.org.br). “O desafio é levar o consumidor a comprar. Não por caridade, mas porque achou bacana, porque desejou aquele objeto” diz ele, que vive desde 1982 no Rio, num apartamento também na Nascimento Silva, pertinho de seu estúdio.
Foi a partir de um convite do Sebrae, em 2004, que Alcantarino começou a se interessar por design sustentável. Naquele ano, ele partiu para Paragominas, uma cidade no Pará emblemática por causa da enorme devastação por que passou, para trabalhar com moveleiros da região e mudar o estilo das peças de madeira pesada fabricadas por lá. O resultado foram três coleções de móveis, batizadas de Paragominas, feitas apenas com sobras de madeira, que foram vendidas, na época, até na rede Tok&Stok. “Eles chegavam a usar três árvores para fazer uma única cama. Propus fazer móveis menos pesadões e aproveitar mais as sobras”, conta.
O mais festejado de todos os projetos teve início em 2007. O Cabanos, que recebeu o Prêmio Idea Brasil e o prêmio do Museu da Casa Brasileira, nasceu também no Pará, na cidade de Barbarena. Desta vez, Alcantarino ajudou uma cooperativa que trabalhava com o que era descartado da Albras, indústria de alumínio associada à mineradora Vale, a desenvolver 40 peças, entre utilitários e móveis infantis. Tudo feito com placas de borracha das correias que transportavam minério e embalagens de pínus.
Foi nessa época que ele criou o Centro de Design da Amazônia, que estabelece um elo entre pessoas talentosas e empresas, e bolou uma grande exposição dentro de uma balsa. A mostra, chamada “Experiência design”, com curadoria do designer Jair de Souza, levou 21 mil pessoas a um barco ancorado por um mês no Porto de Belém. Eram cinco ambientes diferentes, todos com peças de Alcantarino. Na última sala, crianças tinham contato com diversos materiais recicláveis e podiam tentar criar o que bem entendessem. “Foi realmente a primeira vez que muitas daquelas pessoas tiveram contato com o design”, lembra. “Quando se nasce em Belém, você é engenheiro, advogado… Não existe a palavra designer.
Ele próprio se formou em Engenharia e veio para o Rio no início da década de 80 para fazer um mestrado na PUC. Chegou a trabalhar aqui como especialista em Geotecnia, até que um amigo designer o chamou para abrir um escritório, em 1992. De lá para cá, não parou mais. O primeiro trabalho que chamou a atenção do mercado foi uma coleção de vasos de estanho, hoje à venda em diversas lojas da cidade. Com essas peças, em 2003, arrematou o alemão IF Design, um dos mais conceituados prêmios da área, e passou a atender pedidos de arquitetos como Vicente Giffoni, Pedro Paranaguá e Caco Borges. Já desenhou muito móvel para a loja de Claudio Bernardes, o extinto Studio 999, na Barra, no fim dos anos 90, quando sustentabilidade era um conceito ainda embrionário por essas bandas. Hoje, acha que o Brasil está mais ligado em ecologia. “Estamos atrasados, sim, mas não parados”.